Page 20 - Revista SPORL - Vol 57. Nº4
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operatório a longo prazo, embora apenas na RSCcPN, o que         descritas noutros estudos11), com a forte influência do género
suporta a ideia de uma maior importância da eosinofilia nesta    e rinite alérgica no nosso estudo (variáveis não incluídas no
população.                                                       modelo de Tao), ou pelas limitações do desenho e conceito de
                                                                 estudo descritas em seguida.
Os autores encontraram diferenças estatisticamente
significativas no controlo pós-operatório entre doentes do       Limitações
sexo masculino e feminino, com piores resultados no segundo      Relativamente ao desenho do estudo, este é um trabalho
grupo. Tal está de acordo com o reportado por outros             retrospetivo e, portanto, sujeito aos vieses que lhe são
estudos8–10; não existem dados concretos que expliquem           característicos. Embora os autores não esperem vieses de
esta disparidade de género embora alguns autores sugiram         seleção, o estudo não é isento de vieses de informação (pelo
que as mulheres podem ter uma perceção aumentada da              médico otorrinolaringologista responsável pela observação
sintomatologia nasossinusal ou mesmo formas mais graves de       do doente e registo no processo clínico e pelo investigador
doença9.                                                         responsável pela colheita dessa informação) nem de vieses
                                                                 de confusão. Por outro lado, o intervalo de tempo entre
O diagnóstico prévio de rinite alérgica relacionou-se também     avaliação laboratorial (eosinofilia sanguínea) e imagiológica
com o controlo pós-operatório, achado expectável dada a          pré-operatória (TC SPN) e a cirurgia não foi padronizado; além
sobreposição sintomática entre as duas doenças.                  disto, no momento da avaliação pré-operatória (laboratorial e
                                                                 imagiológica) não foi registado o contexto de doença em que
Encontrou-se também uma associação entre o controlo pós-         esta foi realizada (agudização ou não) nem sobre a terapêutica
operatório precoce e tardio. As conclusões desta associação      em curso à data (exemplo: corticoterapia nasal ou sistémica).
são sempre limitadas pelo tempo de seguimento, embora se         A análise do controlo pós-operatório a longo prazo apenas foi
verifique que a probabilidade de um doente com sintomas          possível em 74% dos doentes, e nestes a mediana de tempo de
pós-operatórios precoces ligeiros (controlo parcial) progredir   seguimento foram 35 meses. Como já referido previamente,
favoravelmente para o controlo de doença é bastante superior     na histologia da peça operatória apenas foi realizada uma
(41%) à probabilidade piorar o seu estado clínico (18%). Já      análise qualitativa e não quantitativa.
a percentagem de doentes inicialmente controlados que
progrediu para o não controlo da doença foi excecionalmente      Conceito do estudo
baixa. O modelo multivariado obtido para estimar o controlo      Apesar das limitações referidas, este estudo conseguiu
pós-operatório incluiu as 3 variáveis inicialmente associadas,   demonstrar de forma estatisticamente significativa o papel da
de forma estatisticamente significativa, ao controlo pós-        eosinofilia tecidular como preditor de severidade de doença
operatório. A inclusão do sLM, score E/M e eosinofilia           e controlo pós-operatório na RSCcPN. Subsistem, no entanto,
tecidular, isoladamente não associadas ao controlo pós-          algumas controvérsias nos resultados deste estudo.
operatório na análise univariada, foram, no entanto, incluídas
na análise multivariada reforçando claramente o coeficiente de   Apesar de não existirem diferenças entre doentes com RSCcPN
determinação do modelo, mantendo a significância estatística.    e RSCsPN no que toca a eosinofilia sanguínea, no primeiro
Os achados deste artigo corroboram os dados reportados por       grupo há uma associação positiva entre eosinofilia sanguínea
outros autores3, que defendem o valor preditivo dos achados      e tecidular, algo que não acontece no segundo grupo. Ou
no TC pré-operatório e da eosinofilia tecidular.                 seja, valores elevados de eosinofilia sanguínea na RSCsPN não
                                                                 parecem estar associados a uma maior inflamação eosinofilia
Relativamente à aplicação do modelo proposto por Tao             nasal, ao contrário do que se passa na RSCcPN. O mesmo se
(2018)3, o mau desempenho deste score na nossa população         passa com a não associação entre eosinofilia sanguínea e o
pode ter diversas interpretações. Por um lado, o score           sLM na RSCsPN, por oposição à associação existente (embora
anatomopatológico, à partida mais interessante atendendo às      estatisticamente fraca) na RSCcPN. Parece assim haver um
associações positivas encontradas entre a eosinofilia tecidular  passo intermédio entre eosinofilia sanguínea e tecidular, que
e as restantes variáveis neste estudo, não pode ser aplicado     existe na RSCcPN mas não se verifica na RSCsPN. O presente
pelas razões explicitadas na secção “Resultados”. De facto,      estudo não permite tirar conclusões sobre este ponto.
o score de Tao pressupõe uma análise anatomopatológica
quantitativa relativamente à eosinofilia e na nossa análise      Por outro lado, e apesar de se demonstrar o papel da eosinofilia
apenas foi possível realizar uma análise qualitativa da peça     tecidular como preditor de severidade na RSCcPN, os autores
operatória. Relativamente ao score clínico, este baseia-se em    deste estudo, à luz da literatura atual11–13, defendem que a
variáveis (sLM, score E/M e eosinofilia sanguínea) que no nosso  visão etiopatogénica clássica deve ser repensada. De facto,
estudo demonstraram, se usadas isoladamente, associações         uma percentagem não desprezável de doentes com RSCsPN
fracas ou inexistentes com o controlo pós-operatório. Foi        tem eosinofilia tecidular predominante (10,5%) ou presente
assim sem surpresa que este score não tenha conseguido           sem predominância (26,3%). Este subgrupo corresponde
prever o controlo pós-operatório na nossa amostra.               a cerca de um terço dos doentes com RSCsPN. O raciocínio
                                                                 inverso pode ser aplicado na população com RSCcPN, em que
No entanto, na nossa população, o melhor modelo preditivo        37,3% dos doentes não apresentavam eosinofilia tecidular na
multivariado de controlo pós-operatório incluiu as variáveis em  peça operatória. Os autores consideram questionável aplicar
questão (com exceção da eosinofilia sanguínea). A diferença de
resultados entre o nosso estudo e o de Tao pode justificar-se
por diferenças fundamentais entre o tipo de populações (já

150 REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA DE CABEÇA E PESCOÇO
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