Page 22 - Revista Portuguesa - SPORL - Vol 51. Nº2
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vias aéreas superiores (VAS) de forma parcial prolongada e /  TABELA 1
          ou completa intermitente, que interrompe frequentemente   Resumo das principais diferenças entre a SAOS no adulto e
          os padrões de normalidade da ventilação e do sono.   4  na criança. Adaptado de Fabiani M, Surgery for Snoring and
          Os Distúrbios Respiratórios do Sono são um contínuo de   Obstructive Sleep Apnea Syndrome, 2003 3
          entidades clínicas com grau crescente de obstrução das VAS           Adultos        Crianças
          e que vai desde a Roncopatia Primária isolada, Síndrome de   Ratio M:F  4 : 1        1 : 1
          Resistência das VAS, Hipoventilação Obstrutiva até à SAOS.    Ressonar  Intermitente  Contínuo
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          Apesar de não haver dados epidemiológicos definitivos,
          estima-se que a prevalência de SAOS na criança atinja os 5-6%,   Obesidade  Frequente  Raro
          predominando entre os 2 e os 8 anos, faixa etária em que o   Hipertrofia   Rara    Frequente
          tecido linfóide do anel de Waldeyer está mais hipertrofiado.    Adenoamigdalina
                                                      6,7
          Enquanto a SAOS do adulto ocorre predominantemente no   Sonolência   Frequente       Raro
          sexo masculino, na criança não parece haver diferenças entre   diurna
          os dois géneros. 3                                     Padrão        Apneia        Hipopneia
          A hipertrofia adenoamigdalina é considerada a principal   obstrutivo
          causa pediátrica na patogénese de SAOS, no entanto o grau   Despertares   Frequente  Raro
          de hipertrofia não parece correlacionar-se de forma directa   após apneia
          com a severidade do síndrome segundo os últimos estudos.                            Pouco
          Apesar da obesidade  ser um factor de risco  frequente  no   Padrão de sono  Fragmentação   Fragmentado
          SAOS do adulto é relativamente raro na população pediátrica,   Atraso de
          aumentando, no entanto, a probabilidade de desenvolver   Crescimento  Não          Ocasional
              3,6
          SAOS.                                                   Risco
          Quanto  à  apresentação,  a  sonolência  diurna  excessiva,   Cardiovascular  Elevado  Moderado
          o ressonar intermitente com apneias frequentes e os    Cirurgia     Multinível  Adenoamigdalectomia
          despertares nocturnos são a apresentação típica no adulto,                          Só casos
          ao contrário da criança em que a sonolência é rara, o ressonar   CPAP  Frequente  seleccionados
          prolongado com esforço respiratório, em que predominam as
          hipopneias como padrão obstrutivo e o sono agitado mas com
                                                                             10
          poucos despertares e menos fragmentado.   3       alterar  este  balanço.   Das  condições anatómicas  que
          Quanto às complicações associadas, no adulto, predominam   aumentam  a  resistência  ao  fluxo  aéreo  e  que  predispõem
          as manifestações cardiovasculares, enquanto na criança,   ao colapso das VAS na criança, a mais frequente é a
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          predominam  a  má    evolução  estato-ponderal  e  hipertrofia adenoamigdalina.  Outros factores de risco para o
          neurocomportamental.  A hiperactividade e a falta de   desenvolvimento de SAOS na criança são:
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          atenção estão associadas à SAOS, bem como as dificuldades   •   As dismorfias craniofaciais, nomeadamente o palato
          de aprendizagem e de concentração, com consequente pior   em ogiva, a micro ou retrognatia, a hipoplasia da maxila
          desempenho escolar.6 Apesar de menos frequentes que no   que podem ocorrer por exemplo no Síndrome de Pierre
          adulto, a hipóxia crónica e a fragmentação do sono podem   Robin, de Crouzon, de Treacher Collins;
          cursar com hipertensão pulmonar, arritmias cardíacas, e em   •   As doenças de depósito lisossómico como as
          casos graves, insuficiência cardíaca congestiva e até mesmo   mucopolissacaridoses (Síndrome de Hurler, de Hunter)
          morte súbita.  A Tabela 1 resume as principais diferenças   ou as esfingolipidoses (Síndrome de Nieman-Pick);
                    6,8
          entre a SAOS do adulto e da criança.              •   A macroglossia, que ocorre em várias patologias, por
          A criança gasta, em média, metade do seu tempo a dormir,   exemplo no Síndrome de Down ou no Síndrome de
          pelo que as perturbações da respiração durante o sono são   Beckwith-Wiedmann;
          de particular importância na infância.  Durante o sono há   •   As doenças neuromusculares, como a Distrofia Muscular
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          um  aumento  da  resistência  das  VAS  ao  mesmo  tempo  que   de Duchenne, a Distrofia Miotónica ou a Paralisia
          diminui ligeiramente o Volume Corrente, sobretudo durante   Cerebral;
          o sono REM (rapid eye movement), que é compensado por
          aumento da frequência respiratória de forma a manter a Taxa   •   A obesidade, pelos depósitos faríngeos de gordura que
          de Ventilação por Minuto normal. Durante o sono REM há   predispõem ao colapso das VAS e pela gordura abdominal
          uma atonia dos músculos acessórios da respiração bem como   que prejudica a mobilidade toraco-abdominal. 3,10,11
          aplanamento da posição do diafragma o que prejudica as
          trocas gasosas com alguma retenção de CO . Nos indivíduos   Consulta de SAOS da Criança do Centro Hospitalar do Alto Ave
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          saudáveis a acção dos músculos dilatadores da faringe   Desde Março de 2011 que foi criada uma consulta de ORL
          consegue compensar eficientemente a pressão intraluminal   específica dedicada a crianças com suspeita de SAOS. Para
          negativa faríngea, gerada pela dinâmica intratorácica.   essa consulta foi elaborado um protocolo orientador de forma
          Contudo, factores anatómicos ou neuromusculares podem   a criar um método de avaliação sistematizado desta patologia


       88  REVISTA PORTUGUESA DE OTORRINOLARINGOLOGIA E CIRURGIA CÉRVICO-FACIAL
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