Page 42 - Revista Portuguesa - SPORL - Vol 50 Nº1
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INTRODUÇÃO quer da forma de apresentação do tumor. Os critérios de
Os tumores laríngeos são o segundo tipo mais frequente de elegibilidade de doentes para LHS variam de autor para autor
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tumores (do tracto aero-digestivo) da cabeça e pescoço a nível mas de um modo geral incluem os seguintes : (1) Margem do
mundial, representado os tumores supraglóticos cerca de 30% tumor ≥ 5mm da comissura anterior; (2) Cordas vocais moveis;
a 40% destes . (3) Apenas uma aritenóide pode ser removida; (4) Tumor sem
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A cirurgia oncológica da laringe acarreta frequentemente invasão da cartilagem; (5) Mobilidade da língua mantida; (6)
morbilidade significativa. Apesar da laringectomia total Sem extensão para a área interaritnoideia ou retro-cricoideia;
ser uma técnica adequada e oncologicamente segura para (7) Apéx do seio piriforme livre; (8) Regra geral tumores < 3cm.
tumores laríngeos e hipofaringeos localmente avançados, É objectivo deste trabalho estudar uma série de doentes
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tem um impacto negativo na qualidade de vida dos doentes . a quem foi realizada LHS via externa, comparando os seus
Esta constatação promoveu ao longo de vários anos a procura resultados com outros estudos e avaliando a sua validade
de alternativas quer cirúrgicas (laringectomias parciais via como técnica cirúrgica eficaz no tratamento de tumores
externa ou transorais com laser CO2), quer não cirúrgicas supraglóticos.
(com radioterapia e/ou quimioterapia) com preservação das
funções laríngeas. MATERIAIS E MéTODOS:
A laringectomia parcial horizontal supraglótica (LHS) via Foi realizado estudo retrospectivo com consulta dos processos
externa é uma técnica cirúrgica integrada no contexto dos doentes com registo de LHS via externa no período entre
de tratamento oncológico com preservação de órgão , 1 Janeiro 2000 e 31 Dezembro 2010, realizadas no Serviço de
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cujo principal objectivo é o controlo local da doença, mas Otorrinolaringologia do Instituto Português de Oncologia de
permitindo a preservação das funções fisiológicas laríngeas Lisboa Francisco Gentil (IPOLFG). Foram ainda consultados
da fala e da deglutição com protecção da via aérea baixa. os registos informáticos da actividade cirúrgica do IPOLFG
Os fundamentos da LHS são atribuídos ao uruguaio Justo no Departamento de Gestão de Sistemas e Tecnologias de
Marcelo Alonso (Rosario, 1886 - Montevideo, 1974) e datam Informação.
de 1939. Após a 2ª Guerra Mundial a técnica é conhecida em A Técnica cirúrgica da LHS via externa utilizada encontra-se
Espanha, donde é difundida para outros países europeus, só descrita em “Cirurgia da Laringe. Atlas de Técnicas Cirúrgicas.
se falando nela nos EUA nos finais dos anos cinquenta e só Guia de Dissecção” .
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sendo globalmente aceite na Europa e EUA durante os anos Os doentes foram classificados com a 6ª edição do Sistema
704. Inicialmente (1939), pelo receio de entrada de saliva para de Estadiamento TNM12 do AJCC (American Joint Committee
a árvore respiratória Alonso construía um faringostoma lateral on Cancer) e da UICC (Union Internationale Contre le
temporário, que encerrava num 2º tempo. Com a experiência, Cancer) utilizando a classificação registada nos processos
ao longo dos anos 40, passou a executar a técnica num único e confirmando-a com a descrição clínica, imagiológica
tempo sem construção de faringostoma. e anatomopatológica dos tumores. Foram utilizados os
Em 1991 o estudo Veterans Affairs Laryngeal Cancer Study softwares Bento 4, Numbers 09, Prism 5 for Mac OS X para
Group trail demonstrou que quimioterapia (QT) de indução registo e tratamento estatístico dos dados obtidos.
seguida de radioterapia (RT) permitia tratamento eficaz, para
doentes seleccionados, com tumores laríngeos avançados, RESULTADOS
sem necessidade de laringectomia e sem diminuição da
taxa de cura . Esta ideia levou vários médicos a relegarem Demografia: Durante o período de 11 anos a que se refere
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o papel da cirurgia para um papel secundário (apenas na este trabalho foram registadas 32 LHS por via externa. Todos
terapia de resgate) . Por outro lado as opções cirúrgicas os doentes eram do sexo masculino. A média de idades à data
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transorais com laser CO2 (juntamente com as abordagens da primeira consulta no IPOLFG (que se considerou a data de
exclusivamente médicas) também têm limitado a experiência diagnóstico) foi de 53,5 anos (min: 40, máx: 71, dp=8,76).
cirúrgica em laringectomias parciais , reduzindo o leque de Hábitos tabágicos e de bebidas alcoólicas: À data da primeira
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opções terapêuticas viáveis para tratamento de doentes com consulta 27 doentes (84,4%) afirmaram serem fumadores, 3
tumores laríngeos. No entanto, existem vários estudos que ex-fumadores e 2 não fumadores; 26 (81,3%) tinham hábitos
têm demonstrado a eficácia da LHS no tratamento de tumores alcoólicos, 2 referiram hábitos no passado e 4 negaram.
supraglóticos 8,7,1,9 . Motivos de consulta: Dos 32 doentes (com 1 ou mais motivos
Não descurando a necessidade de controlo local da doença de consulta), 18 (56,3%) tinham queixas de odinofagia, 9
(o principal objectivo da cirurgia oncológica), para qualquer (28,1%) de disfonia, 8 (25,0%) de disfagia, 4 de “impressão”
doente, quando avaliado inicialmente para tratamento de da faringe, 3 de otalgia (reflexa), 4 de tumefacções cervicais, 2
tumor laríngeo, deve ser equacionada a hipótese de cirurgia de perda ponderal e 1 dos doentes, enviado de outro hospital,
com preservação de órgão em função, quer do doente, não tinha registo dos motivos de consulta.
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